Hoje falamos-lhe de Maria Keil, artista pioneira do Metro de Lisboa, que revolucionou a azulejaria moderna portuguesa com as suas intervenções.
Maria Keil nasceu em Silves em Agosto de 1914 e foi uma das mais relevantes personalidades do panorama artístico português do séc. XX, desenvolvendo o seu extenso e diversificado trabalho entre os anos 30 e o seu desaparecimento em 2012.
Identificada pelo historiador José Augusto França como pertencente à 2ª geração modernista portuguesa, Maria Keil destacou-se numa primeira fase nas artes gráficas, na publicidade e nas artes decorativas e num período mais maduro como ilustradora, particularmente de livros para a infância, e pelos seus originais e famosos trabalhos em azulejo. Estes últimos são mesmo considerados de maior importância pois contribuíram, não só para a recuperação do uso deste revestimento, que então se encontrava em declínio, mas também, com a sua abordagem revolucionária, para um espólio azulejar da maior relevância.
Maria Keil Vida e Obra, Breve Resumo
Nascida Maria da Silva Pires torna-se Keil do Amaral em 1933 após o matrimónio com o conceituado arquitecto que a irá catapultar para as tertúlias de artistas e intelectuais da vanguarda artística internacional do seu tempo. Será por esta via que abandonará o academismo enveredando pelo caminho plástico do modernismo.
Nas décadas de 30 e 40 trabalhará em artes gráficas e publicidade, figurinos e cenografia, com nomes de relevo como Ofélia Marques ou Fred Kradolfer, entre outros. É durante este período que realizará decorações para exposições internacionais e para vários projectos promovidos pelo regime totalitário, nomeadamente a Exposição do Mundo Português de 1940, que nesta altura procurava criar uma imagem de modernidade e progresso, simultaneamente tradicional e nacionalista.
O final da II Guerra Mundial ficará marcado em Portugal por uma época de maior descontentamento e contestação que terá como resposta maior repressão e autoritarismo por parte de um regime que, paralelamente com a vizinha Espanha, procurava a manutenção do poder das suas ditaduras, cujos pares haviam saído derrotados do conflito.
Apesar de sempre ter desenvolvido o seu trabalho durante o Estado Novo, o casal Keil do Amaral era opositor do regime de Salazar. Foram ambos membros do MUD (Movimento de Unidade Democrática) e Maria Keil chegou a ser presa pela PIDE em 1953, por ter manifestado o seu apoio à jornalista e activista feminista Maria Lamas.
Este posicionamento irá de certa forma condicionar a segunda fase do seu trabalho, passando então a receber, maioritariamente, encomendas de instituições privadas e particulares.
Maria Keil e a Azulejaria Moderna
Maria Keil considerava que a sua área de trabalho de maior relevância era a azulejaria. Na verdade tinha consciência da importância do seu contributo para a arte do azulejo, esse revestimento com séculos de tradição em Portugal.
Depois de atingir a monumentalidade decorativa no séc. XVIII, os azulejos ganharam um carácter de funcionalidade permitindo primeiro uma mais fácil manutenção e limpeza de espaços interiores e em seguida, por influência brasileira, transpostos também para as fachadas dos edifícios, contribuindo com o seu brilho para a particular cor e luz de cidades como Lisboa.
Os azulejos de fachada eram peças industriais produzidas com as técnicas de stencil ou estampilha cujos módulos se repetiam criando padrões, por vezes emoldurados por frisos que rodeavam os vãos, rematando e valorizando os ritmos impostos pela arquitectura.
Estas intervenções eram maioritariamente implementadas pelos proprietários que pretendiam facilitar a manutenção dos seus imóveis assim como a criação de um elemento distintivo dos seus vizinhos. Não era porém uma prática dos arquitectos que na passagem do séc. XIX para o XX optavam por frisos, molduras ou preenchimento de pequenas áreas, de carácter decorativo de que são exemplos muitos trabalhos realizados pelo pintor J. Pinto para projectos do arquitecto Ventura Terra.
Nos anos 30 do séc. XX os novos conceitos modernistas de arquitectura optaram por volumes paralelepipédicos de linhas simples rectas, uma geometrização racionalista que despreza o decorativo e o ornamental a favor da funcionalidade.
Só nos anos 50, novamente por influência das produções brasileiras, agora de Portinari e Niemeyer, os arquitectos nacionais irão voltar a recorrer a artistas plásticos, ceramistas e escultores com o propósito de, em conjunto, elevarem o sentido estético dos seus projectos. Desta forma irão contribuir para a modernização e reabilitação do azulejo enquanto revestimento de excelência no panorama nacional.
Será neste contexto que Maria Keil é chamada a participar com a sua criatividade para fazer face ao revestimento de grandes vãos, tarefa que se revelará muito mais exigente do que à primeira vista possa parecer.
Num diálogo permanente com a arquitectura, a artista irá desenvolver padrões abstractos geométricos que vão variando em dimensão, cor ou proporção criando efeitos de tridimensionalidade, ritmos e dinâmicas.
Estes padrões servem muitas vezes de fundo a elementos figurativos muito gráficos e estilizados que se combinam e misturam entre si.
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Os Azulejos do Metro de Lisboa
Em meados da década de 50, Maria Keil irá abraçar a maior empreitada do seu trajecto artístico, o Metro de Lisboa.
A construção deste revolucionário meio de transporte iniciou-se em 1955, tendo ficado concluído quatro anos depois. Foram disponibilizadas então onze estações às quais se juntaram mais oito após a segunda fase de construção, entre 1963 e 1973.
O projecto do arquitecto Francisco Keil do Amaral consistia em funcionais corredores abobadados que ligavam os acessos aos átrios e as escadarias às gares mas era necessário animar, iluminar e individualizar as estações. Apesar da falta de verbas por parte do Metro para a execução destes acabamentos, o arquitecto irá recorrer à criatividade da esposa e em conjunto desenvolver uma proposta barata e extremamente eficaz, o revestimento azulejar. Esta solução irá introduzir cor, brilho e diferenciar e caracterizar cada uma das estações.
Assim, enquanto os corredores apresentavam lambris revestidos com pastilha, (pequenas peças de massa de vidro coloridas muito em voga na época), os átrios e as escadas de acesso às gares foram revestidos com as obras que Maria Keil iria conceber e realizar em parceria com a Fábrica Viúva Lamego que passava por dificuldades, uma colaboração muito bem sucedida que iria perdurar para além dos trabalhos do Metro.
Apenas a estação Avenida será entregue a Rogério Ribeiro, sendo todas as outras da autoria de Maria Keil.
Para além do desafio que constituía conceber painéis com dezenas de metros foi imposta, directamente do gabinete de Salazar, uma norma que não permitia a utilização de elementos figurativos. Considerava-se que esses elementos poderiam ser causa de acidentes por distrair a atenção dos utilizadores mas talvez a verdadeira razão estivesse relacionada com a expressão da artista e dos temas que tocavam o neo-realismo, estética que não convinha ao regime.Assim, recorrendo a módulos abstractos geométricos que se vão transformando, criando ritmos e dinâmicas inesperadas, Maria Keil consegue cumprir não só o objectivo inicial como tornar o seu trabalho intemporal.
Se atentarmos em alguns destes projectos encontraremos elementos que nos remetem para motivos presentes na azulejaria antiga como os padrões geométricos dos alicatados mouriscos, a ponta de diamante, a esfera armilar, as folhas de acanto…
Na estação Restauradores foi possível abrir uma excepção a esta regra e introduzir entre os módulos abstratos as tradicionais albarradas com flores a azul e branco. Infelizmente estes azulejos foram destruídos aquando da amplificação da estação em 1977, o mesmo acontecendo a outros em outras estações.Em 2009, a estação São Sebastião tornou-se um nó de ligação entre duas linhas e foi totalmente remodelada contando com a intervenção de diversos artistas entre eles de novo a pioneira Maria Keil, com um mural concebido uma década antes e que nos apresenta uma estilização de árvores que remetem para os espaços verdes envolventes. Um olhar mais atento permite identificar pássaros no meio dos ramos, um elemento figurativo que podemos interpretar como um símbolo de liberdade.
Esta foi a sua última intervenção no Metro de Lisboa mas os trabalhos mais antigos continuam presentes, total ou parcialmente, em estações como o Rossio, Marquês de Pombal, Parque, Alvalade, Roma, Arroios, Anjos…
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