Candeeiro com o símbolo da cidade de lisboa

O Símbolo da Cidade de Lisboa

Percorrendo as ruas da capital encontramos, um pouco por toda a parte, a representação de um barco com duas aves afrontadas. Trata-se do símbolo da cidade de Lisboa, uma barca com dois corvos, elemento central na sua representação heráldica.

Ao pensarmos em barco automaticamente estabelecemos uma relação com o rio que envolve Lisboa e o mar que a liga ao mundo.

A relação da cidade com rio Tejo é umbilical. Se o rio não existisse provavelmente a cidade de Lisboa também não existiria. A sua localização estratégica assim como a sua subsistência foram desde o primeiro momento determinadas por este rio quase mar.

Mas será a barca a representação desta forte ligação?

Em certa medida sim, as intenções de conquista do território litoral por parte do primeiro rei Afonso Henriques não são alheias a esta história. Mas a primeira justificação para este ser o símbolo da cidade de Lisboa está ligada a um acontecimento carregado de simbolismo que se conta rapidamente.

Vicente, o Mártir Ibérico

Estátua de São Vicente, no Miradouro das Portas do Sol.  Idealizada em 1949 pelo escultor Raul Xavier (1894-1964); realizada pelo seu filho, arq. Luís Xavier, entre 65 e 67 e inaugurada em 1970.
Estátua de São Vicente, no Miradouro das Portas do Sol

Corria o ano 304 quando sob domínio romano, o Diácono Vicente do bispado de Saragoça morreu martirizado, sendo o seu corpo lançado às aves e outros animais para que fosse comido.

Diz-se que guardado por um anjo, os animais entre eles corvos, abstiveram-se de se alimentar, obrigando então a que os seus restos mortais fossem lançados ao mar. Terá depois dado à costa em Valência e sido recolhido por cristãos. Inicia-se assim a veneração a este mártir Vicente, autor de milagres e prodígios conhecidos por toda a Ibéria.

Quando em 711 os muçulmanos invadiram a península, os cristãos guardiões do mártir terão transportado e enterrado o seu corpo num lugar que consideraram seguro, o Promontório dos Corvos, mais tarde Cabo de São Vicente, a ponta mais ocidental do Algarve.

Ali permaneceu até 1176, ano em que D. Afonso Henriques mandou buscar os seus restos mortais nesse território ainda mouro, fazendo-os transportar por via marítima para a cidade de Lisboa que tinha sido por si conquistada no ano de 1147.

Mais uma vez os corvos ganham protagonismo, pois consta que estas aves terão acompanhado a barca no seu trajecto até Lisboa.

Desde então São Vicente é o patrono da cidade apesar de ter de partilhar o lugar no coração dos alfacinhas com o popular Santo António, outro símbolo da cidade de Lisboa.



Afonso Henriques e a Conquista de Lisboa

Sé Catedral de Lisboa, onde estão depositadas as relíquias de São Vicente
Sé Catedral de Lisboa

Corresponderá a trasladação das relíquias do santo a uma forte devoção do próprio Afonso Henriques e à sua vontade de as trazer para Lisboa? Nem tanto.

A ideia do rei era legitimar, através da posse das adoradas relíquias, a conquista que pretendia realizar de todo o território litoral e que estas repousassem em Coimbra ou em Braga.

Contudo, o desenrolar dos acontecimentos e a população de Lisboa determinou outra vontade.

A conquista de Lisboa levada a cabo pelo primeiro rei não foi, bem pelo contrário, isenta de sangue, saque e sofrimento para as suas gentes.

Na verdade as crónicas dos conquistadores são até omissas no que se refere à vivência dos primeiros anos de ocupação. Este facto só por si, revela a falta de orgulho e vontade de relatar o que na realidade se passou mas que se conhece pelos registos escritos de estrangeiros que presenciaram os acontecimentos.

Para que a conquista se tornasse pacífica e aceite era necessário que se consolidasse, baseada em aspectos culturais de referência. O antigo culto de São Vicente seria o primeiro passo para a resolução do problema.

Porém o conhecimento da secreta localização dos seus restos mortais por parte dos moçárabes de Lisboa (população cristã que vivia integrada na sociedade muçulmana) permitiu que os mesmos exigissem a sua permanência na cidade após o seu resgate em território muçulmano.

Afonso Henriques foi obrigado a ceder e a promover a construção da Sé Catedral em Lisboa, como digno receptáculo das santas relíquias, conferindo desta forma aos conquistadores a aura de legitimidade de que necessitavam.

Seis anos mais tarde, em 1179, é concedido foral à cidade, assistindo-se desta forma à sua simbólica refundação.

A Barca com os Corvos, Símbolo da Cidade de Lisboa

Iluminura do Livro Carmesim de 1502 e brasão do frontão que encima a fachada da Câmara Municipal de Lisboa
Iluminura do Livro Carmesim de 1502 e brasão do frontão que encima a fachada da Câmara Municipal de Lisboa

A adopção da barca com os corvos como símbolo da cidade de Lisboa está então justificada mas a sua história encerra ainda outras curiosidades.

Esta representação esteve e está presente no património e equipamento urbano do município desde há séculos.

Era esculpida em marcos de pedra nos seus limites, para que quem entrasse na cidade soubesse que passava a estar sob jurisdição da Câmara. De igual modo a representação da barca esculpida em pedra estava presente no património imóvel, como chafarizes ou edifícios, indicando que estes pertenciam à cidade.

A barca com os corvos encontra-se também no património móvel do município como se verifica no Livro Carmesim de 1502, pertencente ao arquivo histórico do Arquivo Municipal de Lisboa. Ali, numa magnífica iluminura, a barca que transporta São Vicente escoltado pelas duas aves negras revela inequivocamente que aquele precioso livro era propriedade da cidade e as informações nele contidas a ela se referiam.

Esta referência tem tal importância que encontramos exactamente a mesma representação esculpida no brasão do frontão que encima a fachada da Câmara Municipal de Lisboa realizado muitos séculos mais tarde. A mesma imagem está ainda presente na calçada portuguesa que envolve a estátua de homenagem ao Marquês de Pombal na Praça com o mesmo nome.

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Os Antigos Chafarizes e o Símbolo da Cidade de Lisboa

Variações sobre o símbolo da cidade de Lisboa pós 1940
Variações sobre o símbolo da cidade de Lisboa

Mas então quando é que se instituiu oficialmente a imagem que hoje encontramos nas armas do município e espalhada, em diferentes suportes e estilizações, um pouco por toda a cidade?

Surpreendentemente, a representação actual, mais familiar aos lisboetas, aproxima-se das mais antigas.

As imagens de uma barca esculpida nas pedras do Chafariz do Andaluz (nas proximidades da Praça Marquês de Pombal) e do Chafariz de Dentro (Alfama) são talvez as mais antigas e as mais próximas da imagem hoje utilizada. Tratam-se de representações muito similares, provavelmente da mesma época, pois ambas se fazem acompanhar das armas do rei D. Afonso IV.

No final dos anos 30 do séc. XX foi promovida a revisão e fixação das bandeiras, armas e brasões dos municípios portugueses. É então que é adoptada para representar oficialmente a cidade de Lisboa uma imagem que resulta da súmula destas duas representações.

Surpreendentemente, a representação actual, mais familiar aos lisboetas, aproxima-se das mais antigas, Chafariz do Andaluz e Chafariz de Dentro.
Símbolo da cidade de Lisboa no Chafariz do Andaluz e no Chafariz de Dentro

É por esta razão que ao observar estes barcos estilizados de linhas simples guardados por dois corvos afrontados, nos sentimos perante desenhos muito familiares e… estranhamente modernos!

Nota: Artigo original publicado em 11/09/2019.


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