A extinção das Ordens Religiosas em 1834 foi um dos episódios marcantes na História de Portugal e consequentemente na História de Lisboa. Um factor determinante no destino do panorama cultural e patrimonial, ao longo dos séculos XIX e XX. Muitos dos nossos posts referem este acontecimento; esta nota ajuda o leitor a melhor entender o seu impacto.
O início do séc. XIX foi marcado por uma longa e sangrenta guerra civil (1828-1834) a que, com a vitória da facção liberal, se seguiu um período de profunda reestruturação na organização sociopolítica do Estado.
Neste contexto teve lugar a incorporação dos bens da Igreja, da Família Real e da Coroa na Fazenda Pública. Pretendia-se acabar com interesses e poderes instalados, expropriando e redistribuindo através da venda, esses bens móveis e imóveis.
Estas práticas tiveram igualmente lugar em França e em Espanha de onde vinham as correntes Iluministas e Liberais, que acabaram de vez com a velha estrutura do Antigo Regime.
Em Portugal já o Marquês de Pombal tinha dado um profundo golpe na Igreja com a expulsão dos Jesuítas em 1759 e iniciado um processo revolucionário de desenvolvimento e reorganização do Estado baseado nas Luzes mas que com o seu afastamento em 1777, foi abrandado.
Após a instituição do regime liberal, profundas mudanças aconteceram nas concepções de poder e propriedade, com repercussões na estrutura social. Também na produção agrícola e industrial se verificaram alterações com impacto na organização do território que marcariam o crescimento das cidades e o urbanismo decorrentes.
Se pensarmos que durante séculos, a arte contou com o Clero e a Nobreza, como seus principais mecenas, percebemos o impacto que estas medidas tiveram ao nível das artes assim como no destino do património artístico e cultural móvel e imóvel então existente.
É sobre este impacto em particular que nos iremos debruçar.
Bens Imóveis: Os Edifícios – Conservação ou Ruína
A entrega dos imóveis das instituições religiosas ao Estado resultou num primeiro momento na sua venda, e posteriormente, na utilização dos que restaram por serviços da administração pública e de saúde, escolas e instituições ligadas à Defesa como quartéis.
A ocupação dos edifícios para diferentes vivências, obrigaram à transformação e adaptação dos espaços, muitas vezes com intervenções radicais irreversíveis. Outros pelo afastamento dos centros urbanos simplesmente ficaram abandonados, sujeitos à progressiva ruína e ao saque.
A extinção das Ordens Religiosas não teve o mesmo impacto em todas as instituições. O facto das ordens femininas terem sido mais protegidas, sendo apenas extintas à data da morte da última freira, permitiu que com alguma astúcia alguns conventos fossem poupados. Foi o caso do Convento dos Cardaes ainda hoje ocupado por freiras dominicanas da Associação Nossa Senhora Consoladora dos Aflitos com obra social de relevo. Este convento detém um espólio patrimonial móvel e imóvel, dignos de nota e visita obrigatória para os apreciadores da arte dos sécs. XVII e XVIII em geral e do Barroco Português em particular.
Outros edifícios que tiveram menos sorte estão, apesar de tudo, a ser recuperados na sua dignidade com a crescente consciencialização da importância patrimonial e cultural. É o caso, do Convento da Graça, ocupado desde há muito por militares da Guarda Nacional Republicana mas recentemente restaurado e aberto ao público. Aqui podemos apreciar a portaria com surpreendentes trabalhos de embrechados, a sala do antigo refeitório revestida com magníficos silhares de azulejos e um claustro.
Apesar de despojados dos seus bens móveis, os edifícios agora recuperados constituem locais privilegiados para exposições e outros eventos ou simplesmente para o deleite do olhar.
Bens Móveis: Peças Perdidas ou Descontextualizadas
A extinção das Ordens Religiosas teve ainda um grande impacto no que respeita aos seus bens móveis. Alguns foram desviados para outros edifícios, eclesiásticos ou não, de forma a serem salvaguardados. Falamos de pintura, escultura, mobiliário e outras peças de artes decorativas que recheavam os conventos e mosteiros.
Estas mudanças na maioria dos casos não foram documentadas, constituindo uma memória que foi sendo transmitida mas da qual se desconhecem os verdadeiros contornos e, por isso, muitas vezes já se transformaram em mitos. Neste contexto, algumas igrejas paroquiais receberam peças de mosteiros ou de conventos extintos que se localizavam nas proximidades.
Assim se explica, por exemplo, a quantidade de imagens de santos que hoje podemos observar em cada altar da Igreja da Graça. Peças de diferentes dimensões e estilos que já tiveram outras moradas.
Mas a maioria do património móvel foi disperso de outras formas mais danosas, roubado, transaccionado, tantas vezes para fora do país, ou mesmo destruído por incúria ou desconhecimento do seu valor.
Estas práticas deram por sua vez origem ao desenvolvimento do mercado de antiguidades, mobiliário, arte sacra, pintura, escultura assim como exemplares truncados de artes decorativas como talha ou azulejos.
Assim também se foram constituindo colecções particulares que com o tempo foram/vão sendo doadas ou adquiridas pelos Museus. Estes, salvo o meritório e fundamental papel enquanto agentes de conservação, investigação e divulgação dos seus espólios, são, em última instância, os depositários de peças descontextualizadas.
O desconhecimento da sua proveniência é um golpe na sua história, informação que seria importante, pois estes objectos constituem em si a resposta de um artista a um encomendador particular ou institucional, específicos. Cabe ao historiador e a outros técnicos multidisciplinares estudar estas peças à luz de análises estilísticas e laboratoriais mas que não contando com documentação constituirá sempre um conhecimento incompleto.
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Revelação das Receitas Culinárias Secretas
Não podemos deixar de referir uma outra consequência da extinção das Ordens Religiosas, esta francamente mais positiva. Os conventos e mosteiros encerravam segredos de receitas de culinária e doçaria, que foram obrigadas a ultrapassar os seus muros.
Com mais ou menos segredo são por este meio dadas a provar a um público mais vasto iguarias até então exclusivas de poucos. Algumas tornaram-se emblemáticas e constituem negócios de sucesso como os pastéis de Belém.
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Doces de ovos-moles, outros tipos de bolos secos e pastéis sem esquecer a famosa marmelada branca das freiras bernardas do Mosteiro de Odivelas, cuja receita apenas foi do conhecimento público aquando da morte da última freira.
Hoje, quase 200 anos passados da implementação desta lei, visitemos os museus, os edifícios conservados ou reabilitados e as tradicionais pastelarias e aproveitemos para fruir e porque não dizer, deliciar, com o legado desta revolução.
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