Artigo original publicado em 02/10/2019.
Os azulejos Arte Nova de J. Pinto constituem alguns dos melhores exemplares deste movimento estético que ainda podemos encontrar em Lisboa e que importa preservar.
Este pintor reúne as tendências estéticas internacionais do seu tempo à tradição portuguesa, revelando ainda cuidado com a função do equipamento e com a gramática da arquitectura onde aplica os seus trabalhos.
Um verdadeiro designer gráfico do início de novecentos que queremos que conheça.
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O Versátil Pintor J. Pinto
Apesar de ter origens em Cacilhas na margem sul do Tejo, José António Jorge Pinto nasceu a 20 de Setembro de 1875 na freguesia da Lapa em Lisboa.
Era sobrinho do pintor naturalista Manuel Henrique Pinto, um dos artistas do Grupo do Leão (tertúlia de artistas portugueses da década de 80 do séc. XIX) do qual faziam parte nomes como José Malhoa, ou os irmãos Columbano e Rafael Bordalo Pinheiro.
J. Pinto estudou na Academia Nacional de Belas Artes, foi discípulo de Ferreira Chaves e de Veloso Salgado, mas apesar da sua formação em pintura, cedo se dedicou preferencialmente à cerâmica. Republicano convicto desenvolveu acções de cariz político e foi professor no Instituto Superior Técnico.
Infelizmente não assinou todos os seus trabalhos, sendo que algumas obras são atribuídas seja com documentação de apoio ou por proximidade estilística.
Ainda haverá muito a explorar para melhor conhecer e divulgar a obra, inegavelmente relevante, deste artista.
A Obra em Azulejos Arte Nova de J. Pinto
Caracteriza o pintor uma paleta de cores fortes contrastantes, com um desenho de traços vigorosos e assertivos em contraponto com uma pintura suave e até lânguida. Os seus trabalhos revelam para além de uma irrepreensível formação clássica, domínio técnico sobre a complexa pintura cerâmica.
Podemos dizer que o pintor soube reunir e reinterpretar duas realidades: as diferentes tendências internacionais da Arte Nova do seu tempo e a cultura nacional tradicional. Esta, tanto no que respeita à tradição azulejar como ao despontar da ideia de casa portuguesa.
A pintura em azulejos Arte Nova assinada ou reconhecida como sendo deste pintor constitui um conjunto muito diversificado. Observam-se trabalhos onde a presença da estética Arte Nova se manifesta em vertente ora geométrica ora naturalista, tendo inclusive realizado trabalhos de carácter publicitário.
Atentemos na diversidade de propostas deste artista.
Estilizações e Motivos Arte Nova
Começamos por destacar três trabalhos onde a estética do movimento Arte Nova é mais evidente: as incontornáveis intervenções no bairro de Campo de Ourique, nos edifícios da Pastelaria A Tentadora e da Livraria e Papelaria A Concorrente, e próximo de Belém numa moradia, nº225 da Rua da Junqueira.
A característica que agrega estes trabalhos relaciona-se evidentemente com o tema que lhes é comum. Mulheres de cabelos revoltos emolduradas por motivos vegetalistas e florais em que girassóis, papoilas e lírios constituem a principal fonte de inspiração dos artistas deste período.
Estes exemplos remetem-nos para o trabalho do ilustrador e designer gráfico checo Alfons Mucha (1860-1939), expoente máximo da ilustração da Belle Époque.
A Intemporal Proposta Geometrizante
Os frisos com padrões que conjugam formas geométricas com cores contrastantes reportam-nos para a linha estética do Jugendstil germânico e austríaco.
Observam-se estes frisos em unidades industriais como são os casos dos Armazéns Casa do Povo d’Alcântara de 1906 e, na mesma zona ocidental de Lisboa, da fábrica de massas A Napolitana construída entre 1908 e 1912.
No primeiro caso, o friso encontra-se conjugado com um magnífico painel figurativo onde se observa um rosto feminino rodeado de flores.
No segundo edifício foi também concebido um painel de azulejos publicitário que infelizmente foi retirado em 1962 e do qual desconhecemos o paradeiro.
As propostas geométricas estão igualmente presentes em elegantes moradias na zona das Avenidas Novas: o Colégio Roussel de 1905, actual Colégio Académico, nº 13 da Av. da República e o palacete Valmor nº 36/38 da mesma artéria.
Os diferentes padrões geométricos que se observam no exterior do colégio encontram-se em grande harmonia com as linhas e proporções da arquitectura neo-românica do edifício projectado por Augusto Machado.
O palacete Valmor é um projecto do arquitecto Ventura Terra que data de 1905/6. Aqui podemos apreciar a genialidade com que o artista adaptou o desenho e a aplicação do azulejo ao arco de volta perfeita que remata o edifício. Um conjunto absolutamente notável a que foi atribuído o prémio Valmor!
Manifestações Naturalistas
Na verdade alguns dos mais belos edifícios de Lisboa apresentam painéis de azulejos Arte Nova de J. Pinto, o que indicia o reconhecimento da qualidade do seu trabalho pelos mais destacados arquitectos seus contemporâneos.
Temos mais três exemplos, também prémios Valmor, agora com influência mais ligada à gramática decorativa francesa e belga, onde o pintor opta por composições mais naturalistas.
Em primeiro lugar, de 1907 o prédio de rendimento nº2 da Av. Almirante Reis, projectado pelo arq. Adães Bermudes, recentemente recuperado e transformado em hotel.
Aqui o pintor oferece-nos uma sequência de painéis alternados. Num cisnes, patos e pombas acompanhados por um cupido; noutro dois pavões envoltos por flores. Completa o conjunto um friso com padrão formado por pombas em ninhos com ovos. O colorido vibrante destes painéis é notável assim como, mais uma vez, a adaptação dos azulejos à arquitectura.
O mesmo se passa com o nº 25 da Rua Alexandre Herculano, um projecto do arq. Ventura Terra de 1911, que apresenta vários registos de azulejos policromos.
Um primeiro registo discreto com flores estilizadas, um segundo registo de maiores dimensões com elementos vegetalistas e florais marcadamente Arte Nova e por último um painel mais naturalista presente num grande janelão que remata o edifício, onde se observa uma cegonha rodeada de rosas.
O programa azulejar convive de forma brilhante com a volumetria e restante decoração do prédio.
De 1929, outra interessante moradia é o nº17 da Rua de Santa Catarina que exibe três frisos num registo baixo e um grande painel que remata o edifício. Neste caso estamos perante a representação de uma diversidade de cestas com flores de grande riqueza cromática e expressão naturalista.
A Tradição Cultural Portuguesa
J. Pinto trabalhou tão bem a policromia como o tradicional azul sobre branco.
É o caso dos painéis que realizou para a casa Cruz Magalhães, actual Museu Bordalo Pinheiro ao Campo Grande, onde é evidente o recurso a uma expressão mais tradicional. Aqui associada a um projecto do estilo casa portuguesa numa proposta de Augusto Machado.
Ou ainda o revestimento exterior azul e branco da leitaria A Camponeza na Rua dos Sapateiros que constitui um paradigma do equilíbrio entre a tradição azulejar portuguesa figurativa do séc. XVIII e os elementos decorativos da estética Arte Nova.
Um exemplar bem conservado que podemos observar e apreciar de perto na Baixa de Lisboa.
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Os Painéis Publicitários e os Quiosques WC
Existem para além deste, outros azulejos publicitários do mesmo autor. São os casos do conjunto do quiosque WC no Jardim Constantino; e o grande remate policromado da Garagem Auto-Palace na Rua Alexandre Herculano.
No nosso artigo A Arte e o Design nos Quiosques WC de Lisboa abordámos um curioso equipamento urbano projectado para a cidade nos anos 10 do séc. XX que incluem azulejos Arte Nova de J. Pinto.
Os painéis do Jardim Constantino e os já desaparecidos do Jardim do Príncipe Real apresentam composições similares. Molduras idênticas entre si, envolvem imagens figurativas. Os primeiros são realizados a azul, amarelo e branco. Os únicos registos fotográficos de que dispomos do jardim do Príncipe Real apenas nos permitem observar as composições e os temas, mas infelizmente nada podem esclarecer sobre o cromatismo.
Em ambos os casos parecem-nos trabalhos direccionados para a função publicitária a tabaco, jornais, flores e bebidas, e destinados a uma localização nobre, o que obrigaria a regras sociais mais rígidas.
Nos restantes quiosques os temas estão também relacionados com a paisagem envolvente mas apresentam uma maior liberdade. Os do Parque Silva Porto encontram-se num contexto intimista e remetem para a natureza bucólica vegetalista. Os do Cais do Sodré relacionam-se com o rio e os elementos marinhos, sendo que o contexto social aqui seria mais popular.
Na verdade estes dois trabalhos parecem ser, de toda a sua obra, os casos onde o artista J. Pinto foi mais livre e ousado, soltando o traço e a imaginação.
Sugerimos a leitura do artigo Os Azulejos Arte Nova em Lisboa.
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