Actualizado em 21/06/2024
Artigo original publicado em 20/01/2021
Já reparou com atenção nas panorâmicas de Lisboa em azulejo presentes em quatro miradouros da cidade? Se não, está na altura de quebrar as rotinas e deslocar-se aos locais onde há quase 60 anos estes painéis se encontram, indicando os pontos de interesse que se avistam, a quem por ali passa.
É para particularidades como esta que a getLISBON se propõe chamar a sua atenção. Quantos não passaram já por estes painéis sem os ver, quantos ignoram a sua autoria…
Vamos conhecer o artista que desenhou estas panorâmicas de Lisboa em azulejo e os sítios onde os pode admirar. Vai gostar de saber!
Faça uma visita guiada às zonas históricas de Lisboa e conheça locais imperdíveis desta magnífica cidade.
Fred Kradolfer, O Designer Suíço em Portugal
Fred Kradolfer foi um designer gráfico que realizou o seu trabalho em Portugal entre os anos 20 e 60 do séc. XX. A importância e diversidade da sua obra, assim como o pioneirismo, ao introduzir no país uma linguagem gráfica moderna, fazem deste artista uma figura incontornável do design português.
Nascido em Zurique em 1903, formou-se em ourivesaria nesta cidade e em artes gráficas na Escola de Belas Artes de Berlim, tendo ainda frequentado arquitectura na Academia de Munique.
Após ter trabalhado como decorador e vitrinista em cidades como Roterdão, Bruxelas e Paris, fixou-se em Lisboa em 1924, cidade onde viveu até ao seu desaparecimento em 1968.
Uma das suas moradas foi a casa das placas do Bairro Alto. Este curioso imóvel apresenta nada menos que sete placas referentes a outros tantos notáveis que ali viveram em épocas distintas.
Fred Kradolfer, durante a sua vida desenvolveu um trabalho verdadeiramente revolucionário no que respeita à comunicação gráfica em todas as suas vertentes, apostando na estilização das formas articuladas com o texto.
Influenciador da segunda geração de artistas modernistas portugueses, trabalhou com nomes como Jorge Barradas, Stuart de Carvalhais, Bernardo Marques, Carlos Botelho e Maria Keil entre muitos outros.
Fez parte da equipa do Secretariado de Propaganda Nacional, conhecida como “a equipa de António Ferro”, facto que lhe permitiu uma vasta produção de grande visibilidade.
Entre muitos outros projectos criou: cartazes publicitários; rótulos; capas e ilustrações de livros e revistas; selos; montras; decorações; vitrais…
Participou ainda em exposições internacionais como: Exposição Colonial de 1931; Exposição Universal de 1937; Exposição Internacional de Nova Iorque em 1939; Exposição do Mundo Português de 1940…
Azulejos de Fred Kradolfer
Fred Kradolfer também realizou projectos para azulejos.
Criou desenhos para lambrilhas, pequenos azulejos de figura avulsa, que representam coloridos motivos típicos portugueses. Estes, muito populares nos anos 30, até hoje, continuam a ser produzidos pela Fábrica Viúva Lamego.
Executou placas cerâmicas com o nome dos pesqueiros da Boca do Inferno, em Cascais, infelizmente já desaparecidos.
Foi ainda autor de projectos de maior envergadura como: dois painéis para o interior do Hotel Infante Santo; a decoração do edifício da sede da Soponata, ambos em Lisboa; ou todo o revestimento azulejar da capela do Campo Militar de Santa Margarida, em Constância.
Os Azulejos da Reitoria
Uma das suas obras maiores é o incontornável revestimento dos corpos laterais do edifício da Reitoria da Universidade Clássica de Lisboa na Cidade Universitária.
Após a rejeição das propostas de Almada Negreiros e Manuel Cargaleiro, o projecto foi entregue a Fred Kradolfer que propôs uma solução modernista mas simultaneamente respeitadora do suporte e da tradição azulejar quinhentista.
A excelência deste trabalho está magnificamente descrita nas palavras de A. J. Barros Veloso no seu artigo “Uma Perspectiva da Azulejaria Portuguesa: A Propósito dos Azulejos da Fachada da Reitoria” publicado no periódico Lisboa Revista Municipal, nº21 em 1987:
“(…) A solução (…) é a vários títulos notável. Em primeiro lugar pela beleza e equilíbrio da composição. Em segundo lugar pela aparente simplicidade do desenho no qual está claramente incorporado um longo trabalho de reflexão. Por último, pela integração perfeita na arquitectura, tarefa em que nada foi desprezado: nem a função dos corpos laterais em relação ao conjunto, nem os vãos, nem os ressaltos na superfície da fachada.
Porém se tudo isto merece destaque, o mais importante é o conhecimento que Kradolfer revelou da azulejaria tradicional portuguesa e da capacidade do azulejo para, por si próprio, gerar ritmos e servir de base a composições. Optando claramente pela valorização dos elementos quadrangulares e rejeitando o uso do azulejo como simples suporte de pintura, mostrou possuir uma perfeita compreensão dos azulejos “enxaquetados” do séc. XVI cujo espírito conseguiu recuperar numa obra de indiscutível modernidade. (…)”
António José Barros Veloso é co-autor com Isabel Almasqué, do artigo “Os Azulejos Arte Nova em Lisboa”, publicado na nossa rubrica getLISBON convida, que sugerimos a leitura.
Panorâmicas de Lisboa em Azulejo
Mas são as panorâmicas de Lisboa em azulejo de Fred Kradolfer que pretendemos destacar neste artigo.
No início dos anos 60 a Câmara Municipal de Lisboa encomendou a Kradolfer o projecto das panorâmicas, destinadas a miradouros da cidade. São no total cinco painéis, realizados em anos diferentes, todos produzidos pela Fábrica Viúva Lamego.
O mais antigo data de 1962 e localiza-se no miradouro do Jardim de São Pedro de Alcântara. No ano seguinte foram executados mais dois, um para o Castelo de São Jorge e outro para o Miradouro da Senhora do Monte, na Graça. Os dois últimos foram realizados em 1965 e destinados ao Miradouro do Monte Agudo e, de novo, ao da Senhora do Monte.
Todos os painéis apresentam o nome do miradouro em que se encontram e a respectiva data em numeração romana, com excepção do do Monte Agudo em que os números são árabes.
Outra excepção presente neste painel é o facto de o símbolo da cidade de Lisboa, uma estilização da barca com os corvos de São Vicente, aqui ter sido substituído pela sigla C.M.L. No mais tardio, do Miradouro da Senhora do Monte, não há referência ao município.
A representação de uma bússola está presente nos painéis do Castelo de São Jorge, no mais antigo da Senhora do Monte e no do Monte Agudo.
Em todos encontramos referência à fábrica onde foram realizados e apenas os da Senhora do Monte, aparentemente, não se encontram assinados pelo autor.
Nos coloridos painéis estão representadas as vistas que se alcançam dos locais onde estão implantados. Ali encontram-se marcadas igrejas, monumentos, edifícios de interesse público, localidades… No mais antigo, São Pedro de Alcântara, estes nomes encontram-se inscritos em pequenas filacteras que pontuam toda a panorâmica.
Agora que já sabe a história das panorâmicas de Lisboa em azulejo, vá até aos vários miradouros, contemple a cidade de várias perspectivas e observe os painéis com um novo olhar. 😉
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